sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Por Não Sermos Humildes



Quanto à chuva, esta caiu em gotas grossas e espaçadas, entremeadas de silêncios e calor. As nuvens enrolaram-se grossas e cinzentas prenunciando uma chuva que não chegou – e eu fiquei tão despreparado para isto tudo que me esqueci de olhar para a água fria que caía do céu e mantive os olhos fechados. Mas no meu mais interior, sentia a chuva com a voracidade de um lobo sobre a presa, tão carente estava dalgum maná divino que pousasse sobre minha cabeça e molhasse meus cabelos – pois a maior prova da misericórdia de deus seria mandar água a quem tem sede e sombra a quem traz a pele riscada de sol.
E havia no ar alguma vibração diferente – apesar do céu cinzento as pessoas estavam suadas e sonolentas voltando para casa. Só que nós, enquanto humanos, não soubemos agradecer por aquilo que nos foi humildemente dado: pois estamos acostumados a receber o melhor – e o melhor de uma chuva, é quando ela traz o frio. E, ah deus, perdoai-nos por não sermos humildes o suficiente para receber aquilo que nos deu com as mãos tão abertas. Mas falta-me a humildade dos que não acreditam mais – e perdoa-me, deus impossível, por não vos devotar meu agradecimento: mas minhas mãos, tu as fizeste tão frágeis, que não pude suster nos dedos que mo-lo destes, a força de seu amor, tão maior que o meu – humano e frágil.

Mas se há nesta vida um deus para os acasos – que este mo perdoe por não vo-lo acreditar de toda minha alma: mas pô-lo-ei em bom lugar dentro de mim, pois tu mo destes a humildade de uma chuva fresca e inútil. E por isso agradeço a misericórdia do que vê a fome e dá pão e vê a sede e dá água. Mas se tu me lançastes no deserto sem água, não serei eu a implorar-lhe misericórdia: pois a pior ofensa que tu podes receber é a ausência de um pedido; e por isso recuso-me a pedir-te água, apesar da sede que cresta minha garganta.

E me lembro de que um dia olhei o céu azul e pensei: mas há ainda a chuva; e a chuva caiu esta tarde, repleta de sabedoria e benevolência.

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