domingo, 28 de julho de 2013

Tentativa de Ser Feliz

 
 
- Por que tem luzinhas no céu, são estrelas?
- Cada luzinha que brilha é uma estrela.
- Mas o que é uma estrela?
- Uma bola de fogo grande, que nem o sol.
- Se são grandes, por que parecem pequenininhas?
- Porque estão longe. Olhe aquele homem gordo correndo lá longe. Ele não parece bem pequenininho? Mas é maior do que você. É enorme!
- Entendi
(Ficou parado me olhando, depois olhou para o homem sumindo à distância. Por fim, voltou-se para o céu e perguntou depois de alguns segundos olhando o escuro):
- Se são tão grandes, por que elas não caem lá do céu?
- Por causa da gravidade.
- É?
- É.
(Colocou a mão dentro do saco de salgadinhos e depois tirou os dedos lambuzados, lambendo-os metodicamente. Depois perguntou com a boca cheia, fazendo os farelos de salgadinho voarem em mim):
- O que é a gravidade?
- Eu sabia que você iria me perguntar.
(Riu, e os farelos de salgadinho se espalharam ainda mais):
- Como você sabia?
- Adivinhei.
- Eu também adivinho muita coisa.
- Eu sei.
- É? Adivinha no que eu tô pensando agora!
(Apertou os olhinhos, fazendo força para pensar. Fez um bico e arqueou as sobrancelhas):
- Gosto quando você pensa.
(Ele volta a fazer a cara de pensamento, não aguenta e ri. Depois eu faço uma careta, e ele abre a boca e mostra a língua cheia de salgadinho mastigado. Faço cara de nojo e ele ri. Depois me canso e acendo um cigarro):
- Eca, que nojo!
(Abana a fumaça e faz cara de nojo):
- Por que você fuma?
- Porque eu gosto.
- Mas fede!
- Você é quem fede.
- Não é nada disso.
- É sim
- Não
- Sim
- Você é quem é fedido
- Você é quem é.
- Você
- Você
(Parei de falar e terminei o cigarro. Encaixei-o entre meu dedão e o indicador, pressionei e a bituca foi parar longe, na grama. Ele olha catatônico a bituca pousar longe na grama e depois se apagar na escuridão. Exclama):
- Uau! Como você fez isso?
- Treino.
- Faça de novo - ordenou
- Não
- Por que?
- Teria de acender outro cigarro
- Acenda
- Não
- Por quê?
- Porque não quero fumar mais agora
- Mas você disse que gosta de fumar. Fume agora!
- Não.
(Silêncio)
- Quer saber da gravidade?
- Não
(Nesse momento ele não me olha mais, os dedinhos perdidos na grama).
- Mas você queria antes.
- Mas não quero mais
(Levanto e deixo-o sozinho por alguns instantes. Depois volto):
- Tá com sono?
- Não
- Mas está ficando tarde
- Não quero dormir
- Sua mãe está te chamando
(Silêncio)
- Quer ir embora?
- Não
- Quer saber sobre a gravidade?
- Não
- Você só sabe falar não?
- Não
(Olha e ri, depois pergunta envergonhado):
- O que é gravidade?
- Por que quer saber?
- Porque quero saber
- Por que pergunta sobre tudo?
- Porque sou curioso
- E chato
- Não sou nada
- É sim, quase insuportável
(Mostra a língua e ri)
- O que é?
- O que é o quê?
- Gravidade
- É assim - paro pra pensar - é como se fosse assim: a Terra é mais forte do que nós, daí ela nos puxa pra pertinho e não nos deixa sair voando por ai. Quando eu joguei o cigarro, ela puxou ele pra perto. A Lua gira em torno da Terra por causa da gravidade, porque a Terra é mais forte, e o Sol é mais forte do que a Terra. Tudo se liga e dai nada sai do lugar, a menos que tudo se mova junto, entendeu?
(Ele está atento, a sobrancelha franzida):
- Sim
- É mentira, não é?
- Sim
- É como se fosse... uma cordinha que segura tudo, como um imã de geladeira. Quando você crescer, vai entender.
- Eu não quero crescer
- Por quê?
- Porque gosto de ser criança.
- Você é feliz?
(Parou, ficou com um ar pensativo, depois me olhou e respondeu, chacoalhando a cabeça negativamente)
- Não.
- E por quê?
- Porque não quero crescer
- Pois sinto lhe informar, mocinho, que todo mundo cresce, vira adulto e depois morre.
(Ficou pensativo)
- E eu vou morrer?
- Sim
- Mas sou só uma criança, veja!
(Ficou de pé)
- Mas as crianças morrem, às vezes.
- Você não gosta de crianças, não é?
- Gosto sim.
- Mas de mim não
- Gosto de você também
- Eu queria ser seu filho
- Por quê?
- Não sei
(Fiquei pensativo)
- Você quer ter filhos?
- Sim
- Você está triste?
- Não sei
- Eu vou ser seu filho
- Por quê?
- Pra te alegrar
- Mas você já me alegra
(Para pensativo)
- Alegria não serva pra nada, não é?
- Na maioria das vezes não
(Silêncio)
- Está com sono?
- Sim
- Vou chamar sua mãe
- Espere
(Ficou atento)
- O que foi?
- Nada, acho que a gravidade estava dormindo também, mas acordamos ela
- Acho que não
- Por quê?
- Ela nunca dorme
- Nunca?
- Nunca
- Como os adultos?
- Mais até
- Ah
- Vamos
- Vamos
(Levanta e chacoalha a roupa coberta de farelos do salgadinho):
- É bom conversar, não é?
- Sim
- É como se fosse uma tentativa de ser feliz
- E você conseguiu ser feliz?
- Não sei, e você?
- Também não sei
- É...
- O que foi?
- Às vezes é melhor não saber mesmo
(Silêncio)

quarta-feira, 17 de julho de 2013

Geladeiras, Tomates e Insônia





Voltei à frivolidade esquecida já há algum tempo para narrar-vos, leitores queridos, um fato que me vem literalmente tirando o sono: a vontade de comer coisas que eu, decididamente, não gosto (e nem nunca gostei) de comer. Dois exemplos que me ocorreram ainda esta semana são: tomate e feijão.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

#Resenhando: 03 obras de Fiódor Dostoiévski

 
 
O #Resenhando de hoje traz 03 obras do escritor russo Fiódor Dostoievski: A Senhoria, O Bobók e O Crocodilo. As resenhas têm como base os livros lançados pela editora 34 e traduzidos por Paulo Bezerra, Boris Schnaiderman e Fátima Bianchi.

quarta-feira, 10 de julho de 2013

sábado, 6 de julho de 2013

#Resenhando: Lis no Peito (Jorge Miguel Marinho)


 
Um livro que pede perdão. Este é o subtítulo da obra de Jorge Miguel Marinho, fortemente inspirada em Clarice Lispector (1920-1977); e há, realmente, muito perdão a ser dado a este livro.

segunda-feira, 1 de julho de 2013

#Resenhando: Perto do Coração Selvagem (Clarice Lispector)




1.       O Enredo
O romance vai narrar a vida de Joana desde a infância com o pai viúvo até a vida com Otávio, passando pelo convívio com a tia, o amor proibido por um professor e a estada no internato.
Desde muito nova Joana mostrava indícios de que seria totalmente alheia à vida com as outras pessoas, tendo um bom relacionamento apenas com o pai, que acaba morrendo, e com o professor que substitui a figura paterna.
É uma menina órfã de mãe que vive com o pai. Depois da morte do pai, Joana vai morar com os tios, que acabam ficando chocados com suas atitudes, como por exemplo, o fato de roubar livros, e mandam-na para um internato. Antes de ir ao internato, Joana mantém relações com um professor, que não percebe que a menina nutre por ele uma paixão.
Ao sair do reformatório, Joana conhece Otávio, que se sente atraído por ela ao vê-la alisar uma cadela grávida. O relacionamento com Otávio nunca foi fácil, pois Joana acha-o desprezível e tem pena dele por isso, não conseguindo se aproximar. O relacionamento entre os dois acaba sendo abruptamente interrompido e Joana refugia-se num Homem desconhecido e acaba tendo relações com ele, que acaba deixando-a. Apenas quando alcança a liberdade Joana vê-se totalmente realizada, ao fim do livro.