1. O
Enredo
O romance vai
narrar a vida de Joana desde a infância com o pai viúvo até a vida com Otávio,
passando pelo convívio com a tia, o amor proibido por um professor e a estada
no internato.
Desde muito
nova Joana mostrava indícios de que seria totalmente alheia à vida com as
outras pessoas, tendo um bom relacionamento apenas com o pai, que acaba
morrendo, e com o professor que substitui a figura paterna.
É uma menina
órfã de mãe que vive com o pai. Depois da morte do pai, Joana vai morar com os
tios, que acabam ficando chocados com suas atitudes, como por exemplo, o fato
de roubar livros, e mandam-na para um internato. Antes de ir ao internato,
Joana mantém relações com um professor, que não percebe que a menina nutre por
ele uma paixão.
Ao sair do
reformatório, Joana conhece Otávio, que se sente atraído por ela ao vê-la
alisar uma cadela grávida. O relacionamento com Otávio nunca foi fácil, pois
Joana acha-o desprezível e tem pena dele por isso, não conseguindo se
aproximar. O relacionamento entre os dois acaba sendo abruptamente interrompido
e Joana refugia-se num Homem desconhecido e acaba tendo relações com ele, que
acaba deixando-a. Apenas quando alcança a liberdade Joana vê-se totalmente
realizada, ao fim do livro.
2. O
Livro
Perto do Coração Selvagem foi o
primeiro livro de Clarice Lispector, lançado em 1944 pela editora A Noite, onde
a escritora trabalhava à época. Para que houvesse a publicação, Clarice fez o
acordo de não pagar e nem receber nada pelo livro. Segundo consta, Clarice
escreveu este livro em 09 meses, como numa gestação: de março a novembro de
1942. Por este livro, recebeu diversas críticas positivas e ganhou o prêmio
Graça Aranha de melhor livro do ano em 1945.
O fluxo de consciência presente
no livro assemelha-se muito ao usado por Virginia Woolf e por James Joyce, o
que gerou comentários sobre influências de ambos os autores, comentários esses
reforçados pela epígrafe retirada d’O Retrato do Artista Quando Jovem, de Joyce.
Além disso, o texto apresenta influências de O Lobo na Estepe (Herman Hess) no
que diz respeito à dualidade que existe nas pessoas (Joana representa o lado
animal, Lídia representa o lado humano; as duas almas que ardem no corpo de
Clarice).
Durante todo o texto o narrador
passa da terceira para a primeira pessoa, o que faz com que se ligue a
personagem Joana à própria Clarice; tanto que, quando se separou, Maury, marido
de Clarice, mandou uma carta onde destaca pontos semelhantes entre a escritora
e sua primeira personagem.
3. Semelhanças
entre obras e autora
Ao
longo do texto, notam-se muitas semelhanças entre a vida da personagem Joana e
da própria Clarice, como por exemplo: as mesmas circunstâncias familiares,
obstinação e resistência às convenções. Além disso, várias passagens do texto,
principalmente na primeira parte do livro, assemelham-se à contos sobre a infância da própria Clarice.
Pode-se destacar também o modo
como Clarice zomba do casamento tanto em um momento deste texto quanto em
outros contos desta mesma época como, por exemplo, A Fuga e Obsessão. Outro
exemplo de comparação que se faz com textos dessa época é o fato de que o
marido de Joana, Otávio, tenta escrever um livro, assim como um personagem de
seu primeiro conto ‘O Triunfo’.
Outro aspecto que seria
recorrente é o atropelamento: Joana atropela a boneca, Virgínia (O Lustre) é
atropelada e Macabéa (A Hora da Estrela) também.
4. Estruturação
do Romance
O livro é dividido em duas
partes: a primeira parte traz capítulos alternados sobre a vida adulta e a
infância de Joana (está ora no passado, ora no futuro), essas alternâncias
ajudam no fluxo de consciência, assim como a fragmentação que permeia todo o
livro. A segunda parte se inicia com o casamento de Joana com Otávio e trata da
vida de ambos até o momento do desfecho do livro. Aqui a presença da
alternância entre infância e vida adulta é substituída por momentos de solidão
e momentos de distanciamento do outro.
Esta quebra na linearidade do
texto acontece devido a esta fragmentação de ideias que é o modo como Clarice sempre
escreveria.
5. Personagens
A narrativa têm, basicamente, 10
personagens: Joana, Otávio, Lídia, o Pai, a Tia, o Tio, o Professor, a Mulher
do Professor, o Homem e a Mulher da Voz.
Lídia: se parece com Ana do conto
Amor (Laços de Família). Serve como contraponto de Joana na história,
idealizando o casamento como a realização de um sonho; assim como a prima (que
é apenas citada no texto) ela é vista como um exemplo da mulher ideal por ser
serena, frágil, dependente e adaptada à sociedade. Isso faz com que Otávio
sinta-se o “macho dominante” enquanto está com Lídia e sinta-se “castrado”
enquanto está com Joana (como todos os demais personagens).
O Professor: é introduzido na
história quando a tia compara Joana à uma víbora, representando uma fuga da
realidade para a menina, que nutre por ele uma paixão que não é recíproca. Além
disso, o professor pode representar o pai ausente e por isso o desejo de Joana
por ele é reprimido numa relação edípica, que é ainda mais reforçada pela
presença da Mulher do Professor que tolhe a relação entre ambos. O Professor
reaparece no fim da história doente e abandonado pela mulher.
O Homem: aparece no fim da
história e Joana encontra nele um segundo porto seguro depois de romper
relações com Otávio. Tem uma relação claramente sexual com Joana, mas é
retirado da história.
Otávio: é o marido de Joana,
ex-noivo de Lídia. Sente-se atraído pela liberdade e pela frieza de Joana, mas
acaba se cansando da dificuldade em lidar com ela e volta para Lídia. É um
advogado que está tentando escrever um livro, mas não consegue, pois acaba
sendo interrompido pela presença forte de Joana. Devido à frieza de Joana
diante da vida e do casamento chama-a de víbora (como a tia).
Joana: é o ponto central do
texto. Ao longo de todo o texto é comparada com animais (víbora, cadela, gata
selvagem, pássaro e cavalo). Apresenta-se como substância, como uma pessoa
ainda em estado bruto, que deve ser moldada às convenções sociais. É mais natural e impulsiva do que humana.
Joana vive em um mundo além do bem e do mal, ou seja, não é nem boa e nem má –
e não se dá conta disso –, seguindo apenas o próprio instinto. Por viver fora
dos padrões e não se adequar ao código de comportamento imposto pela sociedade,
acaba abalando as pessoas.
Por
encontrar em Lídia seu oposto, Joana acaba se fragilizando diante dela (num
momento único no livro, quando as duas se encontram para falar sobre Otávio).
Um exemplo da disparidade entre as duas é o conceito de casamento: Lídia vê no casamento a perfeição e Joana
despreza o casamento.
Logo no início do livro, Joana
pensa que apenas o mal pode ser gerador de prazer, e que tem a certeza de que
dá para o mal. Desde a infância mostra que tem aversão pela bondade das pessoas
e diante das demonstrações de carinho da tia vomita. Mostra-se como uma pessoa
totalmente amoral (isto é: não sabe o que é moral e o que não é moral; ser
amoral é diferente de ser imoral – que é agir contra a moral mesmo sabendo que
é errado). Por ser amoral, Joana não tem consciência de seus atos, não tendo,
por isso, remorso (citar caso de jogar o livro no velho). Essas características
fazem com que Joana observe as pessoas com distanciamento, alheando-se do mundo
humano, vivendo “perto do coração selvagem da vida” como anunciaria a epígrafe
joyciana.
LINK PARA VÍDEO NO YOUTUBE COM A RESENHA DO LIVRO: http://www.youtube.com/watch?v=5F5F106GrEs
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