sábado, 6 de julho de 2013

#Resenhando: Lis no Peito (Jorge Miguel Marinho)


 
Um livro que pede perdão. Este é o subtítulo da obra de Jorge Miguel Marinho, fortemente inspirada em Clarice Lispector (1920-1977); e há, realmente, muito perdão a ser dado a este livro.


O livro conta a história de Marcos César, um estudante do colegial de, provavelmente, 17 anos que lida com os problemas que todo jovem nesta idade lida: os estudos, as dúvidas, a descoberta da sexualidade através do contato com o sexo oposto, as amizades feitas e desfeitas num piscar de olhos, e todos os problemas que inundam a cabeça de estudantes hoje e sempre. O dito estudante, Marcos César, é amigo do escritor, que logo nas primeiras páginas já diz qual será o objetivo do texto: pedir perdão pelos erros cometidos pelo jovem contra Clarice Lispector. A técnica utilizada de iniciar a história desta maneira, sem revelar, contudo, em que consiste o erro a ser perdoado, tem a pura e simples intenção de prender o leitor desavisado num pseudo-suspense juvenil; a técnica não é nem um pouco original, visto que, na vasta obra de Clarice, encontramos um exemplo que pode ilustrar a tentativa do autor: no livro infantil (frise bem esta palavra: INFANTIL) “A Mulher Que Matou os Peixes”, Clarice inicia a história pedindo perdão às crianças por ter matado os peixes, e ao longo do livro, conta sua relação com os animais numa tentativa de redenção.  Note que o recurso utilizado por Lispector num livro infantil é aproveitado pelo autor num livro, claramente destinado ao público jovem.

Após algumas páginas descrevendo como foi dado o primeiro contato entre o escritor e o estudante, o narrador já nos introduz no cotidiano do jovem, mostrando-nos sua vida dentro e fora da escola, dando uma ênfase especial a uma “paixonite” que acomete o herói da história: trata-se de uma estudante de nome Clarice que gosta de ler Clarice. A Clarice (estudante) tem um pequeno círculo de amigos, composto por algumas meninas – que mal aparecem – e por um amigo aparentemente homossexual, que gosta de ler Caio Fernando de Abreu e de folhear os livros de Clarice Lispector. Vale dizer aqui, que o jovem Marcos César também se aventura pelo mundo dos livros; e ponhamos em adendo o seguinte fato: todos os jovens do livro, estranhamente, leem, contrariando a realidade atual – mas este é apenas um mero detalhe que olhos menos atentos vão deixar passar. Talvez este pequeno detalhe seja o motivo pelo qual estes três jovens estudantes (Marcos César, Clarice e o amigo) sejam um tanto quanto excluídos – aparentemente – do grupo social estudantil (ou será apenas impressão?).

Voltando ao livro: por conta do amor de Clarice por Clarice (sim, é sempre esta a linguagem que o narrador usa), Marcos César acaba se aproximando da escritora-Clarice para ter mais intimidade com a leitora-Clarice. E então, da noite para o dia, Marcos passa a ler Clarice Lispector com o maior afinco já documentado para conquistar uma garota que, entre parêntesis, só conhece pela voz, já que nunca teve coragem de olhá-la de frente.

Conforme a história vai passando, o autor vai lançando frases de Clarice Lispector ao relento, numa compilação muito parecida à que vemos nos murais de redes sociais diariamente; tudo numa tentativa desesperada de justificar o título do livro (Lis no Peito – referência ao nome da escritora “Lispector”: Lis+Pector).

Após algumas páginas preenchidas com uma história de amor juvenil sem qualquer substância, o leitor descobre o motivo pelo qual o “livro pede perdão”: o jovem herói – que se torna vilão a partir de então – começa a mutilar os livros de Clarice Lispector depois que descobre um segredo sobre a Clarice-Leitora (leia o livro para saber). E eis o grande pecado do jovem apaixonado. Como era de se esperar, a história tem um final mais do que previsível. Fim de papo, próximo livro.

Sim, estou sendo muito duro com o livro – peço perdão por isso aqui, não num livro. O fato é que, como admirador do trabalho de Clarice, eu esperava muito mais de um livro que tenha ela como “personagem”. O tombo foi muito grande e doeu muito cair em mim e perceber que esta leitura deixou a desejar. Mas há qualidades no livro: além de ser uma homenagem à escritora, “Lis no Peito” foi aparentemente concebido para levar a hermética Clarice Lispector ao público jovem de uma maneira mais acessível. Há dicas de quais livros de Clarice são mais indicados para leitores iniciantes e alguns dados sobre a vida da escritora. Este é um livro que, se não nos dá muito, ao menos não promete nada:             é uma leitura conceituada nos padrões dos YA’s (Young Adults) da vida. O erro maior, no caso, foi meu, que idealizei demais o livro. Recomendo-o aos leitores que querem dar os primeiros passos com Clarice, ou para você que quer simplesmente passar algum tempo com um entretenimento saudável.

Uma coisa que me chamou muito a atenção foi que os capítulos têm como títulos frases de Clarice de crônicas, contos e romances – foi uma das coisas que deu certo neste livro. De início o livro nos pede perdão, e eu concluo dizendo: eu te perdoo.


LINK PARA O VÍDEO NO YOUTUBE: http://www.youtube.com/watch?v=Hq7DJMRlA9U

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