quarta-feira, 17 de julho de 2013

Geladeiras, Tomates e Insônia





Voltei à frivolidade esquecida já há algum tempo para narrar-vos, leitores queridos, um fato que me vem literalmente tirando o sono: a vontade de comer coisas que eu, decididamente, não gosto (e nem nunca gostei) de comer. Dois exemplos que me ocorreram ainda esta semana são: tomate e feijão.


Não gosto nenhum pouco de tomate e só o cheiro do feijão me deixa com os pelos eriçados. E nesta semana, vi-me comendo tanto um quanto o outro. Mas o pior não é nem isso: o mais estranho é que sinto vontade de comer coisas que não gosto no meio da madrugada. Ontem mesmo, para deixar as coisas mais próximas do momento em que escrevo, levantei-me às três da madrugada e o primeiro pensamento que tive ao acordar foi: preciso comer tomates. E por sorte havia tomates em casa – e por mais sorte ainda não preciso mais fazer piadas sobre o preço do tomate por aqui. E para deixar a coisa um pouco mais estranha, fui à geladeira na mais completa escuridão, abri-a, lavei o tomate e ali mesmo, na surdina da madrugada, perfurei com os dentes a fina película que recobre a polpa do fruto proibido por meu paladar: senti o caldo escorrendo pelo queixo e pingando no chão próximo aos meus pés descalços. Sim, comi não um, mas dois tomates crus: lavei-os e comi com a voracidade que usaria para comer um bife ou algo do gênero dos alimentos que entraram há muito para o cânone das tentações gustativas.

Um horror! Não encontro palavras que descrevam o gosto que tem para mim a minha própria traição: traí-me da maneira mais vil que existe, e agora eu sei que os peixes morrem pela boca – e eu também.

O mesmo aconteceu com o prato de feijão que comi ali, encostado à pia, um feijão frio e com o caldo já seco. Comi-o para depois voltar ao repouso sereno das cobertas que me levaram novamente aos braços de Morfeu. Ah Morfeu, por que me abandonaste?

No dia seguinte às minhas aventuras culinárias noturnas o esperado acontece: meu corpo, que não está acostumado à natureza torpe tanto dos alimentos quanto da traição que me autoimpus, sofre as consequências – e eu sofro junto com ele: as náuseas, as ânsias, o peso incomensurável no estômago; quase uma gravidez psicológica. Inclusive, minha menstruação não vem há dezoito anos,  que é normal, visto que não tenho os mecanismos necessários para tanto. Oh, Darwin, divago! Mas por um momento pensei que seria algo engraçado: a gravidez no homem, as náuseas, os desejos estranhos, a falta de menstruação. Ou quem sabe seja apenas a necessidade de um organismo que, por não saber como pedir, pede em silêncio, no meio da noite. E trai-se a si mesmo: e eu, Judas que sou agora, preparo-me para o esplendor de mais uma noite que se abre, serena e tranquila, para minhas excursões noturnas.

Venha Morfeu, segura minha mão, carrega-me para as sombras da inconsciência. 

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