“Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara”.
O Livro dos Conselhos
Serei breve, não obnubilarei a
mente de ninguém com meu fluxo de pensamentos: disparo rapidamente todas as
balas do meu revólver, doa a quem doer.
Sou contra o dia da consciência negra pelo
menos motivo que me faz ser contra o dia internacional da mulher: o
conformismo. Tudo o que quero dizer é que, ao que me parece, esta data foi
criada simplesmente como pretexto para fortalecer a onda de coitadismo que
inunda a sociedade; e ainda sobre um pouco de espaço para dizer o quão deprimente é termos a necessidade de haver uma data para que nos lembremos de que nossa sociedade dá os mesmos direitos à todas as pessoas, independente da cor que possuam.
Sim, eu sei que tudo tem a ver
com a memória do povo negro, que é um povo sofrido. Sei muito bem de tudo isso;
todavia me parece estranho o fato de que apenas por um dia no ano o negro seja
lembrado como um ser guerreiro e digno de respeito. Deveras estranho, eu diria.
É como se nesse único dia, todas as pessoas quisessem se redimir pela opressão,
pelo desrespeito, pela violação dos direitos e por tantas outras atrocidades
cometidas contra negros durante o resto do ano. É pouco, na verdade, é muito
pouco.
E o pior de tudo é que os negros,
coitados, aplaudem. Eles aplaudem de pé a hipocrisia. São vítimas do
coitadismo, tanto ou mais do que os brancos – sim, porque em se tratando do já
supracitado coitadismo, tudo é uma faca de dois gumes.
Do que adiante termos agora um
dia todo, com suas pródigas vinte e quatro horas – diurnas e noturnas –,
dedicado à valorização do negro, se nos demais dias do ano o negro é massacrado
pela sociedade? Desde quando ser negro é sinal de incapacidade para precisar de
amparo?, estendendo e fugindo um pouco da pauta deste post: desde quando ser
negro é um defeito tão grande a ponto de tirar a vaga de uma pessoa branca da
faculdade? Estamos em débito social e histórico com o povo negro – sim, não
estou negando isso; todavia me entristece o fato de que para saldar esta
dívida, que nem é nossa, seja necessário ceder vagas a torto e a direito, ou
ter uma pausa na economia nacional para “supostamente” – veja bem que eu usei
as aspas – suprir as necessidades sociais do povo negro.
Enquanto houver a máscara social,
máscara essa posta em todos nós para esconder com a falsa moralidade o
preconceito e a exclusão que temos, de nada valerá termos um ou dois ou dez ou
quinhentos feriados dedicados ao negro. Enquanto a memória do povo negro não
sair de ações isoladas ou tentativas frustradas de ensino em salas de aula, não
veremos resultados palpáveis na diminuição do preconceito. Enquanto abaixarmos
a cabeça e taparmos os olhos da verdade que há em nós, apenas a mentira nos
servirá de esteio. Enquanto os próprios negros forem inconscientes de seu papel
na sociedade, não fará sentido termos de chamar este dia 20 de novembro – ou outros
que a este se sigam – de dia da consciência, seja ela negra, parda, branca ou
amarela. Enquanto formos cegos para nada nos servirá termos os olhos pregados à
cara.
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