Neste exato momento em que
escrevo, recebo a notícia de que os manifestantes acabam de invadir o Congresso
Nacional. 65 mil pessoas estão em manifestação pelas ruas de São Paulo. Arnaldo
Jabor retratou-se no rádio. A Copa está totalmente submersa diante das
manifestações. A Cinelândia está tomada por nossos patrícios. Toda a Avenida
Rio Branco está tomada. 100 mil pessoas no Rio de Janeiro manifestam-se. Dilma
sendo vaiada. Estou hoje muito orgulhoso de ser brasileiro, e muito feliz por
estar participando deste que foi o primeiro ato realmente patriota que já
presenciei na minha vida. A imagem mais linda que já vi no ecrã da televisão:
os manifestantes saindo às ruas, lembranças da Passeata dos Cem Mil. Ecos do
passado – os primeiros passos para o futuro.
E tudo começou quando o preço da
tarifa do ônibus em São Paulo teve um acréscimo de vinte centavos. E como
ninguém gosta que algo público e de má qualidade fique vinte centavos mais
cara, o povo acordou da apatia em que se mergulhara. Sei, na verdade todos nós
sabemos, que esses vinte centavos não são muito o suficiente para comprar mais
do que um pão – mas é deste pão que há tanto tempo estava preso, mofando, é
deste pão que o Brasil precisava. O fato é que as manifestações tomaram
proporções muito maiores do que o esperado, tanto pelos próprios manifestantes
quanto pelas autoridades. Tais manifestos já são, por si só, motivo de muito
orgulho – mas o melhor nisso tudo, é que vejo pessoas que não precisavam estar
ali, dando seu apoio aos manifestantes. A Classe Média saindo às ruas. Não somos
mais uma classe ou outra: somos brasileiros.
É com grande orgulho que digo: eu
vivi, eu presenciei o despertar de uma nação. Apesar de toda a truculência das
forças policiais, o povo resiste bravamente. Mas há algo que me deprime: é ver
pessoas que, no cúmulo do não-patriotismo, dizem que tudo isso é pura perca de
tempo – coisa de quem não tem o que fazer. Aparentemente as pessoas são ou profundamente
hipócritas ou sofrem de lapsos de memória. A minha vida toda, desde que me
lembro, ouvi os mais velhos falando que nossa geração é acomodada, alienada,
calada, passiva, e muitos outros substantivos. Sempre ouvi que os jovens de
hoje não fazem manifestos, e citavam como exemplo o Movimento dos Caras
Pintadas e tantos outros. E hoje, quando finalmente o jovem brasileiro levanta
o traseiro do assento e toma alguma posição, este mesmo jovem que sempre
recebeu substantivos que denotam fraqueza, tem a sua liberdade tolhida,
massacrada e obliterada pelos mesmos adultos que tanto incentivam uma tomada de
posição. Ora, esses comentários dignos dos “tios à lá Datena” são, não apenas
desnecessários, como também fruto de uma falta de reflexão tremenda: onde está
o povo que lutou na Passeata dos Cem Mil?, morreu?, dormiu? Antes fosse,
sinceramente!
Há pessoas que acreditam que a
única solução para tudo isso é a polícia “descer a lenha” em todo mundo. Meu deus!
Onde chegamos, afinal? Não estou querendo dizer que deveríamos ficar contra a
polícia – lembremo-nos de que estão apenas cumprindo ordens (de uma maneira
totalmente covarde, ainda mais se pegarmos como exemplo a delegada que
desacatou tais ordens e permitiu a manifestação em Belo Horizonte há alguns
dias).
A você, cidadão desinformado, eu
lhe digo: as manifestações já não são mais por simples vinte centavos. Não se
trata simplesmente de uma revolta sobre o transporte público: o povo cansou, a
nação que gostava apenas de carnaval, futebol e novela, aparentemente se cansou
de tudo isso e foi às ruas reclamar de tanta infâmia que vem sendo enfiada
goela à baixo do brasileiro dia após dias nas últimas duas décadas (e vou parar
nos anos 1980-1990, o resto seria demasiado afastado da situação
contemporânea). As manifestações não são mais sobre os vinte centavos, mas sim
pelo meu direito (e pelo direito de quem reclama também) e pelo direito de
todas as pessoas, de irem às ruas e se manifestarem sem serem chamados de
criminosos por conta disso. Não, não se trata apenas dos vinte centavos,
reclamamos de tudo aquilo que vem-nos acontecendo até hoje e que nós, por pura
apatia, calamos. Todos estes protestos não são pelo trânsito, nem pelos vinte
centavos, é por você e por mim. Não se trata de movimentação política, não tem
a ver com esquerda ou direita, nem com partidarismo, nem se trata de um golpe
comunista. Trata-se, simplesmente, da primeira vez em mais de vinte anos que o
brasileiro saiu às ruas para reclamar de muitas coisas até então silenciadas. Esta
não é, de forma alguma, uma manifestação de bandidos, mas sim uma manifestação
de brasileiros – de um povo que quer ter o direito de ir às ruas reclamarem
seus direitos, sem serem, com isso, considerados terroristas.
Infelizmente essa série de
protestos transformou a polícia no inimigo principal da população. Mas a atitude
dos policiais me lembra o longa metragem “O Dia Em Que Dorival Encarou a Guarda”:
em um dado momento, o personagem principal solta uma frase que cabe nas atuais
situações: “pau mandado não tem lema”. Lembremo-nos, amigos, que os policiais
ainda estão cumprindo ordens, e não se deram conta de que, assim como os
manifestantes, fazem parte desta nação.
Acredito que neste momento é
nosso direito e dever tomar as ruas (até porque as ruas são públicas e não
precisamos de permissão para tomá-las segundo o que está descrito no Art. 5°
Inciso XVI da Constituição) em protesto.
Quanto àqueles que ainda insistem
em reclamar porque estão fechando as ruas: não há desculpa mais esfarrapada do
que essa. Além de denotar um profundo “bundamolismo”, ainda indica o quão
egoístas são as pessoas atualmente. Apenas pense, senhor reclamão, que os
manifestantes estão lutando por um direito seu, e que você tem o dever de, como
eles, reclamar os direitos de toda a população. Unamo-nos nesta hora, todos
nós! Junte-se a nós nessa luta (muito justa, diga-se de passagem). E lembre-se
de que enquanto você está do lado do Estado, o Estado está contra você. Apenas pare
para pensar nisso tudo.
Nós temos o direito de protestar,
nós temos o direito à livre expressão, o direito de ir e vir: usufruamos dele
neste momento. E nós não devemos tolerar que o Estado mande os policiais, que
supostamente são treinados para bater em bandidos, baterem em manifestantes. Pensemos:
quantas vezes passamos por verdadeiros perrengues por falta de segurança e não
há um policial para nos auxiliar?, quantos de nós já não foi assaltado e não
recebeu resposta dos policiais? E nesse exato momento, os policiais estão
tomando atitudes totalmente grotescas contra a população que deveria proteger.
O mais interessante de tudo isso,
é que até mesmo a mídia, que até poucos dias estava deturpando a situação,
voltou-se contra o Estado: isso porque os próprios jornalistas estão sendo
presos, estão voltando para casa machucados, impossibilitados de fazerem seu
trabalho.
Nós não podemos agir passivamente
a tudo isto: pacificamente sim – como bem disse o Paulo Cezar Siqueira em vídeo
que foi ao ar hoje no Youtube – mas passivamente não. Não sejamos complacentes
com a polícia que, infelizmente, voltou-se contra nós, curvando-se às atitudes
fascistas que vêm do Estado.
Junte-se a nós neste movimento
pelo progresso do nosso país: agora, não há ricos ou pobres, brancos ou negros,
héteros ou homossexuais, homens ou mulheres – neste momento somos um só ideal,
um só povo: agora, nós somos brasileiros.
Senhores, é com imensa alegria
que digo: a nação, finalmente, despertou.
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